Correndo com a liberdade
(Vicência Jaguaribe)
Correndo na calçada
Como quem não quer nada
Lá vem o Zezé
Na ponta do pé.
Atrás do Zezé
Com cara de índio
Corre o Mané.
Pra onde estão indo?
Vendo correrem os dois
Corre também a Verinha
Que tem cara de arroz
Mas é muito boazinha.
Levantando do meio-fio
Pedro segue os vadios.
E o João, sem o pé de feijão,
Quase entra na contramão.
A Lúcia, a Ana e a Teresa,
Quando tornam da surpresa,
Entram no rolo sem saber
Por que estão a correr.
Os curiosos perguntam
O motivo ou a razão
De tamanha confusão
De tanta criança junta.
Será que aqueles meninos
Correm de boi desenfreado?
Fogem de dentes caninos
Por eles desafiados?
Invadiram o pomar
Do afobado seu Oscar?
Ou mexeram no jardim
Do coitado seu Joaquim?
Os meninos diligentes
Só desejam, simplesmente,
Desfrutar a liberdade
Que lhes permite a idade.
Entre a música e a espada
(Vicência Jaguaribe)
Para o Artur, que desistiu de ser soldado.
Quando pequeno,
O menino queria ser...
Sabe o quê?
Queria ser soldado
Para ficar aquartelado
À espera de ser chamado
Para os bandidos prender.
- Ele era meio açodado.
Corajoso como quê
Não tinha medo
Nem de saci-pererê
Nem de vosmicê,
Fosse quem fosse você.
Mas o garoto cresceu
E o sonho antigo esqueceu.
Deu meia volta no destino
E sem ser mais menino
Armou um golpe repentino
Que parecia um desatino.
Ao piano, uma parte
E ao teatro, a outra parte.
Mas disse ele um dia
Que quer mesmo
Debandar pra Psicologia.
Enquanto isso ele dizia
Eu simplesmente ria,
Porque dizer eu sempre ouvia:
Aperte o gato que ele mia.
No mundo dos carrinhos de brinquedo
(Vicência Jaguaribe)
Para o Ivan, o dono do mundo dos carrinhos.
O mundo dos carrinhos de brinquedo
Era do menino o maior dos segredos.
No mundo dos carrinhos de brinquedo
Não havia nenhum outro folguedo.
No mundo dos carrinhos de brinquedo
As avenidas eram largas e sinalizadas.
Havia pássaros cantores no arvoredo
E a poluição fora há muito eliminada.
O dono dos carrinhos de brinquedo
Tinha autorização do rei e da rainha
Para penetrar no mundo de arremedo
Onde uma banda tocava à tardinha.
O dono dos carros de fantasia
Dirigindo, descia e subia ladeira.
Dos carros, gritava, acenava e sorria
Feliz da vida, na ilusão costumeira.
À direita, o macaco sinalizava.
À esquerda, o coelho apitava.
O peru, fardado, fazia gluglu
Para o colega que sorria – o urubu.
O dono dos carrinhos um Gol largava
Pegava um Corola e via-se num avião.
Depois, entrava num Honda e zarpava
Perseguindo, apressado, a ilusão,
Que, vendo-o chegar, rápido lançava,
Pelo fértil chão, grãos de imaginação,
Até ter o menino o fado preso
E bem seguro na palma da mão.
Até ter o menino o fado preso
E bem seguro na palma da mão.
A formiga amiga e a cigarra mendiga
(Vicência Jaguaribe)
Vocês conhecem a história
- muitos guardam na memória –
da intriga entre as formigas
e as cigarras com suas cantigas?
após anos de agressividade
transformou-se em amizade.
*
Era uma vez...
o que vou contar a vocês.
A boa formiga,
apesar da fadiga,
vendo que periga
sua grande amiga,
a cigarra mendiga,
por ela briga
e se intriga.
Convence outras formigas
das cigarras inimigas,
desde eras antigas,
a ouvir a cantiga
da cigarra mendiga,
antes que ela siga.
Encantam-se as formigas
com a beleza da cantiga.
E propõem à inimiga
cessar a intriga
antiga... pra lá de antiga.
E a turma toda abriga
a cigarra agora amiga.
E enche-lhe a barriga
trazendo-lhe espigas,
frutos da respiga.
E a cigarra fica
sem saber o que diga.
As formigas fazem figa
e esperam que ela diga
qual a próxima cantiga.
Assim teve fim uma briga
antiga... pra lá de antiga.
A sina da menina Dina
(Vicência Jaguaribe)
Um poeminha para uma menina chamada Dina.
A menina Dina...
Qual será sua sina?
A que se destina?
Tão pequenina,
A menina Dina
Já é bailarina?
Colhe uma cravina
E enfrenta a neblina
No começo da matina.
Feito uma Ondina,
Encara águas cristalinas
De um mar verde-piscina.
A menina é traquina,
Mas nunca desatina.
Tem olhos de felina
E boca purpurina.
Sofre mudanças repentinas:
Ontem queria ser campesina
Hoje já quer ser citadina.
Ontem queria um piano fino
Amanhã essa figurinha
– Quem sabe – de inopino
Não quererá ser maestrina?
Por enquanto é muito pequenina
Deve viver sua hora matutina.
A sina da menina Dina
Que o tempo defina
Guiado pela mão divina.
Por onde anda a Teresa?
(Vicência Jaguaribe)
Para uma menina chamada Teresa.
Alguém viu uma menina chamada Teresa?
Moreninha trigueira, vestindo azul-turquesa?
Com a negra cabeleira em uma trança presa?
De olhos escuros e com jeito de princesa?
Por onde andará, meu Deus, a menina Teresa?
Será que está no pomar comendo framboesa?
Na despensa, gulosa, devorando a sobremesa?
Alguém pode me ajudar a encontrar a Teresa?
Será que não se escondeu embaixo da mesa?
Estará na cozinha atacando o bife à milanesa?
Quem sabe no quarto preparando uma proeza?
Um bem-te-vi me cochichou com presteza
Que ela vestiu sua fantasia de tirolesa
E foi ao jardim dançar com a natureza.
Dando asas à imaginação, com certeza,
E um belo e ousado piparote na tristeza,
Entrou no castelo do sonho, com afoiteza
E enfeitiçou-se com a magia da beleza.
Agora sim, com a mais absoluta certeza,
Sei onde procurar a travessa Teresa.
Menino de apartamento
(Vicência Jaguaribe)
Para o Álvaro, menino,
que via o mundo
pela janela.
O menino em pé, na janela,
Olha, protegido pela grade,
O movimento intenso da cidade.
- A vida lá embaixo se aquartela.
- Ninininha! Ninininha!
Ela para, olha para cima e sorri.
- Ninininho! Ninininho!
O menino é mesmo um passarinho.
Carros entram e saem
Folhas balançam e caem.
Um pardal, no muro ao lado,
Desperta do menino o sonho alado.
Passa ele o bracinho pela grade
E tenta alcançar... o que mesmo?
A folha? O pardal? Não sabe.
Talvez até a própria fantasia.
Ou o vento que, vaidoso, desafia
O pardal a um dueto teatral?
Quem sabe, não será a liberdade,
Que ali em frente faz grande alarde?
Mas que menina!
(Vicência Jaguaribe)
Para a Miriam, nos seus 10 anos.
Mas que menina vaidosa!
Olha-se no espelho
E se acha formosa.
E toda dengosa
Procura uma rosa
Que põe no cabelo.
E fica toda prosa.
Mas que menina sapeca!
Não quer mais boneca,
Não joga peteca.
Prefere a janela,
Como antiga donzela.
E espera que passe
Alguém que a arrebate.
Mas que menina faceira!
Prende a cabeleira,
Veste-se ligeira,
Banha-se de perfume.
E sai sorrateira,
Deixando uma esteira
De cheiro e de lume.
Mas que menina espoleta!
Mais parece borboleta,
Batendo as asas ligeiras,
Deixando cores no ar,
Convidando para bailar.
Será uma musa secreta
A inspirar os poetas?
O menino pede um conto
(Vicência Jaguaribe)
Para o Daniel, meu sobrinho.
O menino vai à casa da tia:
- Bênção, tia, e a sua taquicardia?
Baixa a cabeça pra tia beijar:
- Deus te dê coragem pra navegar.
O menino falador e inquieto,
Tem um brinquedo predileto:
Andar pelo apartamento da tia
Olhando aqui; mexendo ali.
Passa pela porta, salta o cabrito.
Tocam os sinos da felicidade.
- Felicidade chega à eternidade?
Respondem que chega ao infinito.
Menino fantasioso e curioso,
Gosta de ouvir histórias da tia.
- Tia, tem algum conto aventuroso
Daqueles com muita fantasia?
A tia liga o computador
E num toque de magia, eis o conto.
Sorri ansioso o menino falador,
Pois sabe, porque não é tonto:
Quem conta um conto aumenta um ponto.
A tia começa com alegria
E o menino entra na fantasia:
Era uma vez um menino treloso,
Astucioso, porém generoso,
Que...
O passarinho foi embora
(Vicência Jaguaribe)
O passarinho acordou
Quando o galo cantou.
Esticou as asas
E também bocejou.
Soltou um trinado
Para a dona da casa.
Mas como haviam deixado
Aberta a gaiola
O passarinho frajola
Disse addio!
Good-bye!
Adiós!
Adieu!
Adeus! Mariolas,
Estou indo embora.
- Cocoricóóóóóó!!!
(Vicência Jaguaribe)
No quintal de minha avó,
morava um galo carijó,
que fazia cocoricóóó!!!
e pulava numa perna só.
Seu nome era Faraó.
Veio dos canfundós,
mas só comia pão-de-ló
misturado com abricó.
No quintal de minha avó
sentia-se sozinho o Faraó.
E, triste de fazer dó,
o pobre do carijó
agora entoava só
um soturno cocoricó.
Vendo o galo borocoxó,
não se deixou vencer minha avó.
Aconselhou-se com uma arqui-avó,
que por ela tinha um xodó.
Disse-lhe a arqui-avó
que o mal do carijó
era viver muito só.
Aconselhou-a ir a Marajó,
a ilha de seus avós,
procurar para o Faraó
uma companheira mor,
que dançasse carimbó
e cacarejasse – oh!
bem mais que sol-e-dó,
Foi e voltou minha avó,
voando que nem um socó.
E trouxe para o Faraó
uma bela fêmea carijó,
que cantava feito um curió.
Armou-se, então, um forrobodó,
no quintal de minha avó,
para receber a bela carijó.
Foram convidados, sem quiproquós,
até os galináceos arigós
moradores do sertão do seridó.
Quando viu a bela Ziló,
sentiu por ela o Faraó
um grande xodó.
Mal a orquestra desatou o nó,
os dois caíram no forrobodó,
que teve forró e carimbó.
E, mesmo caindo um grande toró,
a festa acabou só
quando viu o Faraó
as cores do arrebol.
- Cocoricóóóóóó!!!
Tudo isso aconteceu, vejam só,
no quintal de minha avó,
onde morava o Faraó,
um belo galo carijó.
2 comentários:
Tia Vicência, eu amei a sua poesia, gostei que você colocou meu nome e o do Vinícius. Beijos. Carol♥
Tia, a mamãe me contou do meu livro. Amei a noticia, eu estou ansiosa para ver e ler. Eu queria ter ido com a mamãe ver a senhora, mas ela não me levou, pq eu estava na aula. Bjs, bjs, bjs, bjs.:} ♥♥♥♥♥. :
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